sexta-feira, 27 de junho de 2014

Bachianas poéticas Anh. I 156 - I 224


 

BWV Anh. I 156 [31]
Herr Christ der einige Gottersohn


Cristo Senhor, Filho de Deus, único,
Do Deus amantíssimo e bondoso...
– O que significa “Filho único”? –
Pergunta o rapaz irreligioso.
– Como pode a graça ser restrita
A um tempo único, ditoso? –
– Cristo é como o Sol – digo – Reflita:
Não importa quantas vezes nasça
É um só, e eterna a Sua graça.


Montevideo, Confeitaria Facal, 
16 de fevereiro de 2012.

 



BWV Anh. I 157 [35]
Ich have Lust zu scheiden


Ah! Tenho desejo de partir
E de ir-me a terras mais serenas:
Mas, ai! o que há de garantir
Que ali cessarão as minhas penas?
Não importa! quero ir-me já!
Em outras paragens hão de vir
As dores que eu tenha que sentir...
Um alívio certo vir-me-á:
As dores daqui não ‘stão por lá...


Montevideo, Confeitaria Facal, 
16 de fevereiro de 2012.

 



BWV Anh. I 190 [28]
Ich bin ein Pilgrim auf der Welt


Sou um peregrino neste mundo:
Caminho, caminho e longe vou...
Envelheço a cada um segundo –
Do que eu era ontem, que restou?
Sei: minha jornada aqui começa,
Tão plena de sonho e de promessa...
Qual esforço meu será fecundo?
Nos meus desatinos eu me afundo,
Sem Deus, prece, amor ou dó que o impeça...


Montevideo, Plaza Fabini, 
15 de fevereiro de 2012.

 



BWV Anh. I 191 [34]
Leb ich oder leb ich nicht


Vivo, ou não vivo: já não sei...
Se amar é viver, eu já morri;
Se a morte é só paz e Deus, seu rei,
Não, não me é a morte quem sorri.
Não, não é a morte, que esperei;
Ai! Se sofro tanto é que ainda estou vivo!
Ai! Por que esta vida é necessária?
Por que esta labuta atroz, diária?
Por que o sofrimento corrosivo?


Montevideo, Casa Retiros San Jose, 
18 de fevereiro de 2012.

 



BWV Anh. I 193 [34]
Herrscher des Himmels, König der Ehren


Ó Senhor dos céus, da Honra és Rei!
Como aparecer ante o Teu trono?
Eu, que neste mundo tanto errei,
Ah! Conseguirei Teu santo abono?
Para longe fui de Tua Lei;
Ai! Eu dei as costas ao Teu Rosto!
Mesmo assim, me sinto perdoado...
Maior é o perdão do que o pecado!
E Teu amor tira o meu desgosto!


São Paulo, 15 de maio de 2012. 
Toca Händel, o Messias – Hogwood

 



BWV Anh. I 195 [29]
Murmelt nur, ihr heitern Bäche


Murmurai, ó águas brincalhonas
Em vosso percurso pela serra;
Que correis mil e uma maratonas
Na mata que tanta vida encerra.
Saltitando pedras, corredeiras,
Lá se vão as águas-puladeiras.
Correm para o mar, o seu destino,
Como corro eu, em desatino,
Para a vala e a cova derradeiras.


Santa Terezinha, casa da Neca, 02 de março de 2012.

 



BWV Anh. I 196 [22]
Auf, süß entzückende Gewalt


Ó encantadora força, doce
Sois ao paladar de minha alma!
Ainda que em meio às trevas fosse,
Apoiado em vós, teria eu calma.
És força benigna, que me cura
Da dor em meu peito, fria e dura.
Ó força benigna, eis minh’alma!
Embora eu caminhe à sepultura,
Apoiado em vós, terei eu calma.


Santa Terezinha, casa da Neca, 1º de março de 2012.

 



BWV Anh. I 197 [33]
Ihr wallenden Wolken


Carregadas nuvens, que trazeis
O pranto celeste em abundância;
Observo o poente e já... eis!
Raios e trovões em alternância.
Será sobre vós que vem o Cristo?
Não! Esta bobagem eu repilo!
É sutil o símbolo imprevisto:
Nuvens são somente tudo aquilo
O que os homens temem ver, e ouvi-lo.


Santa Terezinha, casa da Neca, 1º de março de 2012.

 



BWV Anh. I 199 [14]
Siehe, eine Jungfrau ist swanger


Vede! uma virgem está prenhe!
A graça de Deus a escolheu.
E, ainda que o mundo só desdenhe,
Ela glorifica o Filho seu.
Mesmo que sofrida, não diz “ai”.
A glória do Filho é sua glória.
E Ele é grande não por Sua história:
Maior fora Adão! Vede! Pensai!
Pois este não teve mãe nem pai.


Santa Terezinha, casa da Neca, 1º de março de 2012.

 



BWV Anh. I 209 [7]
Liebster Gott, vergißt Du mich


Ó amado Deus, de mim esquece,
Pois de Ti também eu esqueci...
Quem contra Ti peca, este padece –
O castigo bem que mereci.
Mas, não! Tua graça justo cresce
Quando contra Ti cresce o pecado!
Uma alma, quando corrompida,
Por mais que se tenha distanciado,
Ainda de Ti recebe vida.


Porto Alegre, casa da Neca, 28 de fevereiro de 2012.

 



BWV Anh. I 210 [22]
Wo sind meine Wunderwerke


– Onde estão as minhas maravilhas? –
Perguntou o Pai ao Filho amado.
– Quais delas? São tantas as tuas filhas! –
Respondeu Jesus, indo ao Seu lado.
– Falo das que sempre permanecem,
– Que são imortais: não envelhecem. –
Soube então Jesus que grande agrado
Tem Deus pelas almas que O conhecem!
Preferiu sorrir, e estar calado.


Porto Alegre, casa da Neca, 28 de fevereiro de 2012.
Para Neca

 



BWV Anh. I 211 [20]
Der Herr ist freundlich dem, der auf ihn harret


Oh! Quão amigável é o Senhor
Com todos aqueles que O esperam.
Os que mantêm vivo o Seu temor
E Seus mandamentos bem ponderam.
Quem O espera, sabe que já vem;
Mas ai! quem O espera, dizei, quem?
Ele vem como um ladrão na noite,
Quando a escuridão vibra o açoite.
Mas quem é que O espera? Ai! Ninguém!


Porto Alegre, casa da Neca, 28 de fevereiro de 2012.

 



BWV Anh. I 212 [25]
Vergnügende Flammen, verdoppelt die Macht


Ó chama do júbilo, vem, dobra
Teu fulgor, teu brilho chamejante;
Celebra, de Deus, a grande obra,
E que de minh’alma eu que cante.
Sem fim são os mundos que criou
O Deus de poder e de bondade.
E a alma que define quem eu sou
É eterna, e não conhece idade!
Ó chama! Teu brilho já me invade!


Montevideo, confeitaria Facal, 
16 de fevereiro de 2012.

 



BWV Anh. I 224 [7]
Reißt euch los, bekränkte Sinnen


Livrai-vos, espíritos sofridos,
Das penas da vida e dos pecados.
Elevai aos céus vossos pedidos
Por serdes dos males libertados.
Ele é quem ampara os oprimidos,
Ante Ele todo mal reflui...
Ele é quem dá força e dá guarida,
Ah! Para não serdes como eu fui:
Mais feliz nos sonhos que na vida...


São Paulo, 13 de maio de 2012.



FIM



Bachianas poéticas BWV Anh. I 11 - I 19



 
BWV Anh. I 11 [7]
Es lebet der König, der Vate rim Lande


Eis que vive o Rei, o Pai na terra,
Ele é o Pai dos tantos filhos seus.
Quem o tem por rei, este não erra,
Quem o quer por pai, o tem por Deus.
Nasceu p’ra banir, do mundo, a guerra,
Num reinado eterno só de paz.
Ó mundo! Acolhei o soberano,
O Deus poderoso, o Deus sagaz!
Percebei que Deus se fez humano!


Santa Terezinha, Casa da Neca, 03 de março de 2012.
 



BWV Anh. I 12 [28]
Frohes Volk, vergnügte Sachsen


Ah, povo feliz! Saxões contentes!
Sim! Um gênio santo aqui viveu,
A ele deu Deus, mui veramente,
Escrever, no mundo, o que era Seu.
Ah! Como seria pobre o mundo
Sem o fervilhar de sons, fecundo!
Ah! Que escuridão para os ouvidos!
Os séculos, mortos, vãos, perdidos...
Bach também foi Deus! Ou me confundo?


Montevideo, Mercado del Puerto, 
Cabaña Verónica, 15 de fevereiro de 2012.
 



BWV Anh. I 13 [33]
Willkommen! Ihr herrschenden Götter der Erden


Oh! Sede benvindos soberanos,
Deuses soberanos desta terra!
Vinde e nos livrai de erros e enganos,
Livrai-nos do mal, da dor, da guerra.
Deuses da bondade e compaixão,
Cativai as almas deste mundo!
Que o i’migo torne-se um irmão,
Que o ódio vil vire amor profundo.
Vinde, soberanos deste mundo!


Santa Terezinha, casa da Neca, 03 de março de 2012.
 



BWV Anh. I 14 [31]
Sein Segen fließt daher wie ein Strom


Sua bênção flui qual u’a fonte;
Sim, com novas graças sobre mim!
E, por mais que as meça, veja ou conte,
Eu não as abarco: são sem fim.
Se estou desatento Ele me guarda,
No escuro, clareia a luz marfim,
Ah! Ele erradica a dor bastarda
E em meu triste peito põe bonança,
Pois me faz lembrar que há sempre esperança.


Montevideo, Plaza de la Constituición (Matriz),
15 de fevereiro de 2012.
 



BWV Anh. I 15 [25]
Siehe der Hüter Israel


Vede! O Guardião de Israel,
O Deus-forte, Todo-Poderoso!
É Ele quem guarda o bom fiel,
E ao ímpio atribui um fim danoso.
Não! O ímpio é quem se castiga
Quando de Deus foge, iracundo.
A graça de Deus é mais amiga;
Pois o amor de Deus é mais fecundo:
E Israel é todo o grande mundo!


Santa Terezinha, casa da Neca, 03 de março de 2012.
 



BWV Anh. I 16 [22]
Schließt die Gruft! Ihr Trauerglocken!


Ó! Fechai a tumba, sinos tristes!
Que a lápide seja bem selada!
Os vivos e os mortos vós bem vistes
Ao dobrardes cada badalada.
No sepulcro estão os que estão vivos
E os mortos conversam, maus, lascivos.
Ai! Os mortos-vivos não são nada!
A morte os não faz mais reflexivos,
Mas os dobres são por um e cada...


Santa Terezinha, casa da Neca, 03 de março de 2012.
 



BWV Anh. I 17 [33]
Mein Gott, nimm die gerechte Seele


Ó meu Deus, aceita a alma reta,
Que não se afastou do Teu caminho;
Tu és seu propósito e sua meta,
És sua salvação no torvelinho.
Quem a Ti buscou, viveu em paz
Ainda que em meio a mil tormentas;
Para quem Te ama tanto faz
O bem ou o mal, pois o sustentas.
Ó homens! Ficai de almas atentas!


Montevideo, Laperez B&B, 15 de fevereiro de 2012.
 



BWV Anh. I 18 [31]
Froher Tag, verlangte Stunden


Ó dia feliz, horas queridas!
Ah! Lá fora canta a doce chuva,
Lava as almas, cura as mil feridas
Que mil almas vestem como luva.
Um cheiro de sombra sobe ao céu;
Brilha junto ao sol: casa a viúva!
E até mesmo o povo morto, incréu,
Festeja as benesses deste dia,
Em que Deus desceu com galhardia!


São Paulo, 20 de novembro de 2011.
 



BWV Anh. I 19 [25]
Thomana saß annoch betrübt


São Tomé sentou-se assim bem triste
Depois de tocar a santa chaga.
Uma culpa amarga nele insiste
Que nem, de Jesus, o amor, apaga.
Ah! Tivesse logo acreditado
Que da morte Ele regressara...
Oh! Mas duvidar era o seu fado!
Embora Sua volta fosse clara,
Não pudera crer, e duvidara...


Santa Terezinha, casa da Neca, 03 de março de 2012.


Bachianas poéticas BWV Anh. I 3 - I 10




BWV Anh. I 3 [34]
Gott, gib dein Gerichte dem Könige


Dá Teu julgamento ao rei, ó Deus!
E ‘inda neste mundo o purifica.
E então seja digno entre os Teus,
E não dos que a terra mesmo abdica.
Ai! Ai! Quantos reis são filisteus
Mas fingem pisar em terra santa!
Somente poder é o que desejam
E as bênçãos do céu nem mesmo almejam...
Tamanha tolice aos céus espanta!


São Paulo, 15 de maio de 2012
Última a ser composta.
Toca Handel, O Messias, por Koopman

 



BWV Anh. I 4 [36]
Wünschet Jerusalem Glück


Oh! Desejai sorte e alegria
A Jerusalém, cidade santa.
Foi lá que o clamor de Deus se ouvia,
Onde fulgurava bênção tanta!
Imaginai, pois, aquele Dia
Da nova Cidade que virá!
A Jerusalém que Deus nos dá,
Renovada em glória e profecia,
A Jerusalém nova já ‘stá!


São Paulo, 15 de maio de 2012.
Toca Händel, o Messias – Koopman

 



BWV Anh. I 5 [12]
Lobet den Herrn, alle seine Herrscharen


Louvai ao Senhor, todas as hostes!
Inflamai-vos! Oh! Ardei de amor,
Como ardeu o fogo em Pentecostes!
Como é digno amar ao grão Senhor.
Catedrais de pedra erguem brado
Silencioso e mudo, mas eterno.
E este querubim pétreo, talhado,
E os outros infindos ao seu lado,
Erguem seu louvor ao Deus superno.


São Paulo, 15 de maio de 2012.
Toca Händel, o Messias – Koopman

 



BWV Anh. I 6 [20]
Dich loben die lieblichen Strahlen der Sonne


Os sublimes raios do sol cantam
Tua honra eterna e sem igual!
E as gotas suaves abrilhantam
Teu perdão, que cobre todo o mal.
Ó Senhor! Não deixes que esqueçamos
Que é só para Ti para onde vamos.
Pois não há destino para a alma,
Senão no Senhor! E toda a calma
Vem do amor à Árvore e Seus Ramos.


São Paulo, 15 de maio de 2012.
Toca Händel, o Messias – Koopman

 



BWV Anh. I 7 [23]
Heut ist gewiss ein guter Tag


Ah! Hoje é assaz um belo dia,
Dos que nada ficam a dever;
Essa plenitude deve ser
U’a graça, do mundo, à revelia.
Cá embaixo nada justifica
Que tamanho bem me fosse dado:
Sombra fresca, água desta bica,
Pão caseiro, luz que tremelica...
De dias assim não tenho enfado!


São Paulo, 06 de dezembro de 2011.

 



BWV Anh. I 8 [20]
Neujahrkantate


Oh! Uma cantata de ano novo
Que celebre o tempo que há de vir,
Que prometa o bem a todo o povo,
Faça bem sonhar e bem sorrir.
O que guardam estes dias tais?
Serão diferentes, ou iguais?
Estará a sorte no futuro,
Ou será o fado triste e duro?
Basta! Celebremos sem os ais!


São Paulo, 06 de dezembro de 2011.

 



BWV Anh. I 9 [31]
Entfernet euch, ihr heitern Sterne


Dispersai-vos, ó ‘strelas risonhas;
Correi pelo céu em alvoroço!
Acorda, acorda, ó tu que sonhas,
Vê! O mundo fez-se mais moço!
Olha! A vida antiga se renova,
O que existia era só esboço!
A lua partiu-se, eis a prova:
Ah! O Prometido já nos veio –
Já não mais há dor, pena ou receio.


São Paulo, 20 de novembro de 2011.

 



BWV Anh. I 10 [27]
So kämpfet nur, ihr muntern Töne


Batalhai, assim, vós tons vivazes!
Batalhai por serdes escutados!
Tu, ó céu! Que música nos trazes?
Cantarão os anjos nestes lados?
Certas melodias são eternas:
Ah! Falam do amor: boas, fraternas.
Ó Deus! Tu que reges todo som!
Tu que as melodias bem governas!
Das músicas nobres, dá-me o dom!


Montevideo, Mercado del Puerto, 
Cabaña Veronica, 20 de novembro de 2011.