Luis Henrique
Beust
Dies Domini
D i a d o S e n h o r
Dies Amoris
D i a d e A m o r
Poesias
Celebração
do Bicentenário
do Nascimento
de Bahá’u’lláh
de Bahá’u’lláh
(1817–2017)
e do Báb
(1819–2019)
e do Báb
(1819–2019)
Capítulo 1
Dies Domini
Dies Domini
D i a d o S e n h o r
Deus quer, o homem sonha
Deus quer, o homem sonha,
a obra nasce.
Deus quis que a Terra
fosse toda uma,1
Que tudo unisse, nada
separasse;
Que não houvesse mais
barreira alguma.
Fez-se, então, todo um
mundo diferente,
Uma nova invenção cada
segundo.
O mundo novo estava pela
frente,
Pois era, a cada passo, um
novo mundo.
A aldeia global que Deus
nos fez
Pena ainda o pecado
original,
Pois a guia a tremenda
insensatez
De se afastar do bem,
querendo o mal.
O mundo dividido se
desfez,
Mas apenas no corpo, não
na alma.
É necessário agora, de uma
vez,
O amor universal, que cura
e acalma.
Campinas, 27 de outubro de
2017
[1] Os dois primeiros versos são de Fernando Pessoa: Mensagem, O Infante.
Campinas,
13 de setembro de 2017
[1] Apocalipse 21:1 — “E vi um novo céu e uma nova terra. Porque já o primeiro céu e a primeira terra passaram”.
No inverno, embaixo do gelo
No inverno, embaixo do
gelo,
O vivo parece morto,
E o morto, apesar de
sê-lo,
Não nos causa desconforto.
Jazem em paz morto e vivo:
“Dormente” é o adjetivo
Que lhes cabe com
conforto.
Quando surge a primavera,
E as neves já vão embora,
O calor que agora impera
Mostra o vivo em boa hora.
A verdade manifesta:
As coisas vivas em festa,
As mortas fedem agora.
A Primavera divina,
Que nos veio sem ruído,
De certo mudou a sina
Deste mundo dolorido:
O que é vivo está
brotando,
Com cores embelezando
O mundo reflorescido.
O que era morto,
entretanto,
Ao que é vivo agora cede:
Não adianta reza ou
pranto,
O morto já se despede.
Eis! o mundo atrapalhado,
Pois o morto acobertado
Apodrece e cheira e fede.
Já se fez o novo céu
Já se fez o novo céu,
Já se fez a nova terra.[1]
São João contempla,
incréu,
Quanto o Apocalipse erra.
Mas é o que o povo imagina
O que distorce a doutrina;
E não o que o Texto
encerra.
Destituídos de alma,
Querem tudo exatamente
Ao pé da letra, sem calma
Para pensar claramente
Nos símbolos tão benditos,
Os grãos mistérios
prescritos,
Que hão de ser
eternamente.
A carne nada aproveita;
O espírito vivifica.[2]
Céus de pó é só desfeita;
Terra de pó só pó fica.
Tudo o que a Escritura
fala
É só espírito, e exala
O simbolismo que explica.[3]
Campinas, 12 de outubro de
2017
[1] Apocalipse 21:1 — “E vi um novo céu e uma nova terra. Porque já o primeiro céu e a primeira terra passaram”.
[2] João 6:63 — “O espírito é o que vivifica, a carne para nada aproveita; as
palavras que eu vos disse são espírito e vida.”
[3]
Bahá’u’lláh, Kitáb-i-Íqán, p.47.— “[...] o termo ‘terra’ significa a
terra do entendimento e conhecimento, e o ‘céu’, o da Revelação Divina.”
O céu de Deus não é o céu
O céu de Deus não é o céu;
Sua terra não é a terra.
Quem não vê por trás do
véu
Das palavras, muito erra.
Ele disse vir do céu, [1]
Mas de que espécie de céu,
Se nasceu aqui na terra?[2]
Ele disse estar no céu
Quando plantado na terra.[3]
Qual a espécie, pois, de
céu
Que este grão mistério
encerra?
O que se vê é mortal,
O invisível, imortal:[4]
Quem o percebe não erra.
O céu, portanto, onde
estava,
De onde viera e viria,
Era o bom céu que Ele
amava,
Para onde subiria.
Era o céu da condição
Do excelso coração
Do bom Deus que Lhe
sorria. [5]
Campinas, 13 de outubro de
2017
[1] João 6:38 — “Porque eu desci do céu não para fazer a minha vontade,
mas a vontade daquele que me enviou.”
[2] João
3:13 —“Ora, ninguém
subiu ao céu, senão o que desceu do céu, o Filho do Homem, que está no céu.” (A
ênfase é minha. De agora em diante abreviado como AEM)
[3] Lucas 2:4-7 — “E subiu da Galileia também José, da
cidade de Nazaré, à Judeia, à cidade de Davi chamada Belém (porque era da casa
e família de Davi), a fim de alistar-se com Maria, sua mulher, que estava
grávida. E aconteceu que, estando eles ali, se cumpriram os dias em que ela
havia de dar à luz. E deu à luz o seu filho primogênito, e envolveu-o em panos,
e deitou-o numa manjedoura,
porque não havia lugar para eles na estalagem.”
[4] 2 Coríntios 4:18 — “não atentando nós nas coisas que se veem, mas nas que se
não veem; porque as que se veem são
temporais, e as que se não veem são
eternas.” (AEM)
[5]
Bahá’u’lláh, Kitáb-i-Íqán, p.47. — “[...] o termo ‘terra’ significa a
terra do entendimento e conhecimento, e o ‘céu’, o da Revelação Divina.”
Vieste do céu de antanho
Vieste do céu de antanho,
Mas ninguém Te viu chegar.
Na primeira vez, que
estranho,
Foi Maria a Te gerar.
Mas disseste do céu vir,[1]
Para os cegos a Te ouvir
Não Te enxergarem no ar.
Novamente Tu vieste
Do céu de onde vieras. [2]
Mas na abóboda celeste
Ninguém nada viu,
deveras...
Pois o céu não é o céu
Como quer o povo incréu
Desta era e de outras
eras.
Como Deus é invisível,[3]
Puro Espírito (Amém!), [4]
É de todo inconcebível
Que o céu de onde o Verbo
vem
Seja o céu visível: este.
Não! O céu de onde
desceste
É invisível também!
Campinas, 04 de outubro de
2017
[1] João 6:38 — “Porque eu desci do céu não para fazer a minha vontade,
mas a vontade daquele que me enviou.”
[2]
Bahá’u’lláh, A Proclamação de
Bahá’u’lláh, Epístola ao Papa Pio IX — “Ó Papa! Rompe os véus. Já veio aquele que é o Senhor dos
Senhores, envolto em nuvens, e o decreto foi cumprido por Deus, o
Todo-Poderoso, o Independente... Ele, em
verdade, desceu outra vez do céu, assim como daí desceu a primeira vez.”
(AEM)
[3] João 1:18 — “Deus
nunca foi visto por alguém.”
[4] João 4:24 — “Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem
em espírito e em verdade.”
Vieste do céu de antanho 2
Vieste do céu de antanho,
Mas ninguém Te viu chegar.[1]
Ai! que fenômeno estranho
O de Deus no mundo entrar:
Disfarçado, sussurroso,
Sem escarcéu assombroso;
(Sandálias a se arrastar...)
Ele disse que viria
Do mesmo céu de onde veio;[2]
Mas do ventre de Maria,
Em meio a angústia e
anseio,
É que Ele veio ao mundo!
Portanto, não me confundo:
“Céu” não é o de estrelas
cheio.
“O Reino de Deus não vem
“Com aparência exterior”,[3]
Nos ensinaste também
Para evitar esta dor:
De se ser cego aos sinais
Que nunca são materiais:
É o mesmo céu anterior!
É um céu que não é céu,
Mas lugar desconhecido.
Coberto por denso véu,
Onde habita o Deus
querido!
Puro Espírito é Deus,[4]
Portanto os Profetas Seus
Vêm de um “céu” que é
escondido.
O corpo de Jesus, claro,
Nasceu do ventre da Pura,
Mas o Espírito, reparo
— o Verbo que salva e cura
—,
Veio de onde não se sabe,
“Lugar” que no céu não
cabe,
Que é só distância e
lonjura...
Campinas, 09 de outubro de
2017
[1]
Bahá’u’lláh, A Proclamação de Bahá’u’lláh,
Epístola ao Papa Pio XIX — “Ele, em verdade, desceu outra vez do
céu, assim como daí desceu a primeira vez. Guarda-te de disputar com Ele do mesmo modo como o
fizeram os fariseus com Ele (Jesus), sem evidência clara ou prova alguma.”
(AEM)
[2] Mateus 24:30 — “Então, aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem; e
todas as tribos da terra se lamentarão e verão o Filho do Homem vindo sobre as
nuvens do céu, com poder e grande glória.”
[3]
Palavras de Jesus, Lucas 17:20.
Viesses como Te esperam
Viesses como Te esperam,
Do que valeria a fé?
Os céus noutros tempos
eram
Inalcançáveis até!
Agora — o tempo das dores
—
Mil objetos voadores
Ocupam os céus; não é?
Por certo o céu de onde
vens
É um céu mais altaneiro,
Pois a grandeza que tens
Não cabe no céu brejeiro.
Do céu da primeira vez[1]
É que desceste outra vez:[2]
Céu invisível, matreiro.
Deus é o Rei da pegadinha!
Testa o nosso
entendimento,
Pois Jesus disse que vinha
(E veio!) do firmamento.
Mas o céu de Deus não é
O céu chinfrim e ralé
De sol, lua, estrela e
vento...
Campinas, 25 de setembro
de 2017
[1] João 6:38 — “Porque eu desci do
céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou.”
(AEM)
[2]
Bahá’u’lláh, A Proclamação de
Bahá’u’lláh, Epístola ao Papa Pio IX — “Ó Papa! Rompe os véus. Já veio aquele que é o Senhor dos
Senhores, envolto em nuvens, e o decreto foi cumprido por Deus, o
Todo-Poderoso, o Independente... Ele, em verdade, desceu outra vez do céu, assim como daí desceu a primeira vez.”
(AEM)
Ai! como um ladrão na noite
Ai! como um ladrão na
noite,
Ó Senhor, por que Te
escondes?[1]
Por que da angústia o açoite,
Sem se saber quandos e
ondes?
Ó nuvens, acaso O vistes?[2]
Estrelas! estais tão
tristes!
Ó céus, que máscara
pondes?[3]
Que mistério atrapalhado
A volta do bom Senhor.
Busquei-O por todo lado,
Procurei Seu resplendor.
Mas cada sinal Seu some,
Veio até com outro Nome![4]
(Clarins em surdo
clangor...)
Como na primeira vinda,
Nada foi como esperado.[5]
Alguns esperam ainda
O Messias celebrado.[6]
Tu O buscas por aqui,
Mas Ele não ‘stá aqui;
Está ali, do outro lado...
Campinas, 12 de outubro de
2017
Para
Shahbaz Fatheazam
[1] Mateus 24:42-44 — “Vigiai,
pois, porque não sabeis a que hora há de vir o vosso Senhor. Mas considerai
isto: se o pai de família soubesse a que vigília da noite havia de vir o
ladrão, vigiaria e não deixaria que fosse arrombada a sua casa. Por
isso, estai vós apercebidos também, porque o Filho do Homem há de vir à hora em
que não penseis.”
[2] Mateus 24:30 — “e
verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder e grande
glória.”
[3] Mateus 24:29 — “as
estrelas cairão do céu, e as potências dos céus serão abaladas.”
[4] Apocalipse 3:12 — “A
quem vencer, eu o farei coluna no templo do meu Deus, e dele nunca sairá; e
escreverei sobre ele o nome do meu Deus e o nome da cidade do meu Deus, a nova
Jerusalém, que desce do céu, do meu Deus, e também o meu novo nome.” (AEM)
[5] As profecias do Antigo Testamento
diziam que o Messias 1) viria de um lugar desconhecido, 2) sentaria no trono de
Davi, 3) viria com um grande exército, 4) viria brandindo a espada da justiça.
Nada disso se cumpriu ao pé da letra, mas tudo se cumpriu simbolicamente: 1)
embora o corpo de Jesus viesse de Belém, o Verbo que era Sua verdadeira
realidade vem de “lugar” incógnito; 2) o trono de Jesus era de um domínio
celestial, não terreno, como Ele mesmo disse: “O meu Reino não é deste mundo” (Jo 18:36);
3) o exército de Jesus não era um exército de soldados armados, mas sim de
incontáveis almas puras que, ao longo dos séculos, com seu sangue e sua fé
conquistaram o mundo; 4) a espada de Jesus era Sua Palavra, mais afiada que as
espadas de aço, como Ele mesmo disse: “Não cuideis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer paz, mas espada” (Mateus 10:34)
[6] Os sacerdotes Judeus rejeitaram
Jesus, e os judeus ainda esperam o Messias da Casa de Israel.
Aquela estrela no canto
Aquela estrela no canto
Piscou há pouco p’ra mim.
P’ra ela a tolice humana
É uma tragédia sem fim.
Galileu já lamentara
A interpretação ignara,
O entendimento chinfrim.[1]
As observáveis estrelas
Jamais podiam cair![2]
Seria até ofendê-las
Imaginar tal porvir.
Vão impassíveis no espaço,
Cingidas por Deus no
abraço:
Por aqui não hão de vir.
Vem, estrelinha, revela
O símbolo bem oculto,
A metáfora tão bela:
O que cai em grande vulto
São os sacerdotes-guias:
São agora estrelas frias;
Eis o entendimento adulto.
Campinas, 05 de outubro de
2017
Para o Dr. Feizi Milani
[1] Galileu Galilei, Carta ao Padre
Benedetto Castelli, 21/12/1613: — “[...] se bem que Escritura não possa
errar, os seus intérpretes e expositores poderiam, entretanto, incorrer em por
vezes em erros, e de várias maneiras. Entre esses erros, um seria gravíssimo e
frequentíssimo, ocorrendo sempre que tais intérpretes quisessem ater-se ao mero
significado das palavras, porque assim produziriam não só diversas
contradições, mas graves heresias e também blasfêmias. [...] as Escrituras,
ainda que ditadas pelo Espírito Santo, admitem, pelas aludidas razões, interpretações
longínquas ao significado literal em muitos pontos.”
[2] Mateus 24:29 — “E, logo depois da aflição
daqueles dias, o sol escurecerá, e a lua não dará a sua luz, e as estrelas
cairão do céu, e as potências dos céus serão abaladas.”
Quem poderia supor?
Quem poderia supor?
Os valorosos ipês
Enfrentam o frio com cor.
Roxos, amarelos... vês?
Quando o inverno nos ataca
Lá detrás daquela vaca
As flores erram de mês.
É agosto, não setembro,
E o inverno corre solto;
Vi manacás (já me lembro)
Floridos no ar revolto.
As paineiras iam rosas,
Bem-te-vis cantavam,
prosas,
E eu em cobertas
envolto...
A Natureza desperta
Antes que os homens o
façam.
Quem é do universo a Meta
Tem cem mil véus que O
disfarçam.
Mas todos, na Natureza,
Têm essência de pureza:
Seus sentidos não se
embaçam.
Ah! Quando o homem for
perfeito
(Ou somente for melhor),
Sentirá o mesmo efeito
Que as flores sabem de
cor:
Predizem a primavera
Revestem-se de aquarela,
E louvam o Artista-Mor.
O que é de Deus vem pequeno
O que é de Deus vem
pequeno,
Na fé e na Natureza:
No começo é um leve aceno,
Um sopro só de pureza.
Depois é que se agiganta,
Com glória potente e
santa,
Com força e com realeza.
Abrir os céus e descer,
Baixar a Cidade alada...[1]
Não é este o proceder
Que ao nosso Senhor
agrada.
Viera, disse, do céu; [2]
Mas céu era apenas véu,
Como a Sua Mãe sagrada.
Fica o fato, inapelável,
Fica a certeza certeira:
Do lugar inalcançável
De onde vieste a primeira,
Também desta vez
voltaste... [3]
Seja isso o que nos baste
Para uma fé derradeira.
Campinas, 04 de outubro de
2017
[1] Apocalipse 21:2 — “E eu, João, vi a Santa Cidade, a nova Jerusalém, que de Deus descia
do céu, adereçada como uma
esposa ataviada para o seu
marido.”
[2] João 6:38 — “Porque eu desci do céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele
que me enviou.” (AEM)
[3] Bahá’u’lláh,
A Proclamação de Bahá’u’lláh,
Epístola ao Papa Pio IX — “Ó Papa!
Rompe os véus. Já veio aquele que é o Senhor dos Senhores, envolto em nuvens, e
o decreto foi cumprido por Deus, o Todo-Poderoso, o Independente... Ele, em
verdade, desceu outra vez do céu, assim
como daí desceu a primeira vez.” (AEM)
Senhor! Tanto me proteges
Senhor! Tanto me proteges
Do quanto eu nem sei que
havia.
Tudo sabes, tudo reges,
Mas eu... descuidado eu
ia...
Os males que desconheço
Tu os sabes pelo avesso!
Serena minha agonia!
Da boca da fera vil
Tu me salvas num relance.
Onde há perigos mil,
Guardas-me p’ra que eu
avance.
Quem melhor me cuidaria
Nesta longa e triste via
Até que enfim eu descanse?
Tu te cobres de mil véus;
De bilhões! digo melhor.
Pois Teus céus não são
Teus céus,
E o que é ainda pior:
Cumpres diferentemente
O que o homem, diligente,
Estuda e sabe de cor.
Tu me queres cego ao mundo
E vendo co’ coração.
Este céu de azul profundo
Não é o céu de onde vens,
não.
Tu disseste que virias,
E um novo Nome terias...[1]
(Quem tem olhos, veja
então!)
Campinas, 29 de setembro
de 2017
[1] Apocalipse 3:12. — “A quem
vencer, eu o farei coluna no templo do meu Deus, e dele nunca sairá; e
escreverei sobre ele o nome do meu Deus e o nome da cidade do meu Deus, a nova
Jerusalém, que desce do céu, do meu Deus, e também o meu novo nome.” (AEM)
Vejo as notícias diárias
Vejo as notícias diárias
P’ra saber se é o fim do
mundo...
Desgraças, tragédias
várias:
O mundo é um fosso
profundo.
Por amor não mais se
morre,
Se mata! E tudo que ocorre
É vil, desonesto e imundo.
Certamente já vivemos
Os tais dias do Juízo,
E os sinais nós já os
vemos,
Sem pesquisar ser preciso.
O sol e a lua sumiram,
Tantas estrelas caíram, [1]
E o mundo perdeu o siso.
Mas o sol ainda brilha!
E a lua dá sua luz!
Eis a grande maravilha
Que o entendimento produz:
Sumiu o sol da Verdade
E a lua sem claridade
É a Justiça sem jus...[2]
Estrelas do firmamento!
Como seguis altaneiras?
Não é chegado o momento
De despencardes,
certeiras?
Ai! As estrelas caídas
São as vergonhosas vidas
De clérigos em sujeiras.[3]
“O Reino de Deus não vem
“Com aparência exterior!”[4]
Assim ensinou tão bem,
Há tempos, nosso Senhor.
Quem busca sinais no céu
Esperará sempre ao léu,
Cheio de medo e de dor.[5]
O Dia de Deus já veio!
Na noite veio o Ladrão!
Já partiu-se a lua ao
meio.
É tempo de provação.
Com os olhos contemplai!
Não com os da carne! Ai!
Mas sim co’os do
coração...[6]
Barueri, HP, 11 de junho
de 2015.
[1] Mateus 24:29 — “E, logo depois da aflição daqueles
dias, o sol escurecerá, e a lua não dará a sua luz, e as estrelas cairão do
céu, e as potências dos céus serão abaladas.”
[2]
Bahá’u’lláh. O Kitáb-i-Iqán, p. 29. —
“Indiscutivelmente, nas sucessivas
Revelações, o “sol” e a “lua” dos ensinamentos, leis, mandamentos e proibições
que se estabeleceram na Era precedente e que abrigaram o povo daquele tempo,
obscurecem-se, isto é, estão esgotados e já não exercem sua influência.”
[3]
Bahá’u’lláh. O Kitáb-i-Iqán, p. 29. —
“Assim, pois, está claro e evidente que
as palavras – “escurecer-se-á o sol, e a lua não dará a sua claridade e as
estrelas cairão do céu” — se referem à perversidade dos sacerdotes e à anulação
das leis firmemente estabelecidas pela Revelação Divina, tudo o que foi predito,
em linguagem simbólica, pelo Manifestante de Deus.”
[4] Lucas 17:20.
[5]
Bahá’u’lláh. O Kitáb-i-Iqán, p. 30 —
“[O povo do Evangelho] Não
acordou ainda para perceber que todos os sinais preditos já se manifestaram,
que o prometido Sol se levantou sobre o horizonte da Revelação divina e o “sol”
e a “lua” dos ensinamentos, das leis e da erudição de uma Era anterior já se
tornaram obscuros e desapareceram.”
[6] Mateus 13:15 — “Porque o coração deste povo está endurecido, e ouviu de
mau grado com seus ouvidos e fechou os olhos,
para que não veja com os olhos, e ouça com os ouvidos, e
compreenda com o coração”.
O Dia de Deus chegou
O Dia de Deus chegou,
Mas todos ainda dormem…
A trombeta já soou
(E ‘inda querem que os
informem?)
Sim! É de Deus este Dia!
Haja riso! Haja alegria!
('inda querem que os
transformem?)[1]
Alguns em ira se explodem
Para matar inocentes;
Em prantos todos acodem...
(São ocorrências
recentes.)
Se é o grande Dia em
verdade,
Por que há tanta maldade?
(Confusas estão as
mentes...)
Mas... se pensarmos bem
certo,
Todo dia vem no escuro...
O dia de sol aberto
É um dia já maduro.
Sim! À meia-noite é
hoje...
Não é ontem, não... é
hoje!
Todo dia nasce obscuro...
E depois de muita noite
(Noite esta que é já dia),
A escuridão perde o açoite
E a alvorada irradia.
Luzes leitosas ao longe,
Na hora em que ora o
monge.
Não é noite... nem é
dia...
O pano do céu se aclara,
Bem devagar, na surdina...
A luz é escura, não
clara...
Luz de noite que termina.
Muito depois, o sol nasce,
Definindo, assim, o
impasse,
Demonstrando quem domina.
Não lastimemos as trevas,
Pois os pássaros já
cantam!
(Ó Deus, meu Deus! Tu me
elevas!)
Lumes as trevas
suplantam...
É dia e é noite, assim.
É noite e é dia, sim!
(Com trinados que o
garantam!)
Os pássaros, serão loucos?
Cantam p'ra noite ou p'ro
dia?
Os homens, de ouvidos
moucos,
Não ouvem sua euforia.
Perguntam por que, por quê
O cantar, se não se vê
No horizonte a luz bem
fria?
Os pássaros cantam, sim,
Não pela luz que não veem,
Mas por sentirem que,
enfim,
Termina a noite... pois
creem!
Eles cantam a Promessa;
Sabem que no vice-versa
Noite vai e dia vem.
É o Dia de Deus, e o
mundo,
Alucinado e demente,
Se perde a cada segundo:
Cruel, frio e
impenitente...
Mas a Luz há de brilhar...
O Sol vai se levantar...
O grão Sol do Onipotente.
É assim, pois, este caso
Que parece tão confuso.
Desde a alvorada ao ocaso
É dia, mas inconcluso.
O Dia de Deus nasceu
Na noite que não morreu...
Façamos dele bom uso...
Campinas, 16 de julho de 2016
[1]
Bahá’u’lláh. Seleção dos Escritos de
Bahá’u’lláh, nº VII. — “Em verdade digo, este é o Dia em que a humanidade
pode contemplar a Face do Prometido e Lhe ouvir a Voz. O Chamado de Deus
ergueu-se e a luz de Seu Semblante resplandeceu sobre os homens. É dever de
cada um apagar da tábua de seu coração o traço de toda palavra vã e, com a
mente aberta e imparcial, fixar os olhos nos sinais de Sua Revelação, nas provas
de Sua Missão e nas evidências de Sua glória.
“Grande,
em verdade, é este Dia! As alusões que lhe são feitas em todas as Sagradas
Escrituras como o Dia de Deus atestam sua grandeza. A alma de todo Profeta de
Deus, de todo Mensageiro Divino, estava sequiosa de atingir este Dia
maravilhoso. Todos os vários povos da terra também ansiaram por alcançá-lo.
Mal, porém, o Sol de Sua Revelação se manifestara no céu da Vontade de Deus,
quando todos, salvo aqueles a quem o Todo-Poderoso se dignou guiar, foram encontrados
atônitos e negligentes.”
E quem responde ao chamado
E quem responde ao chamado
Da voz que provém do céu?
A voz do Senhor amado
Que fala de trás do véu?
Ai! Os ouvidos são surdos,
Os pensamentos, absurdos,
Trata-se de um povo
incréu.
A voz do Arauto soou
Nos roseirais de Shiráz.[1]
O mundo se transformou;
Nasceu a era da paz.
O que fora prometido,
Em um tempo há muito ido,
Mostrou-se bom e veraz.
O próprio Criador veio
Para renovar o mundo.
O que era árido e feio
Virou um jardim fecundo.
Ele aceitou a prisão,
Tortura e humilhação,
Um sofrimento profundo...
O Wachet Auf de Bach[2] era
Indício do que viria:
Novo tempo, nova era,
Que a Voz do alto traria.
Mas os ouvidos são moucos;`
Os que escutam são tão
poucos
(É sua a vera alegria!).
Barueri, HP, 05 de julho
de 2016
[1] O
Báb, o Arauto de Bahá’u’ll´ha, provinha da cidade persa (atual Irã) de Shiráz,
famosa por seus roseirais.
[2] Cantata BWV
140, de Johann Sebastian Bach, intitulada Wachet Auf, Ruft Uns Die Stimme! (Despertai,
pois a Voz nos chama!).
Aprendi a ouvir silêncios
Aprendi a ouvir silêncios
E a ver de olhos fechados.
Muitos silêncios.
Silêncios
Ecoando em todos lados.
Quando busquei ser feliz
Foi que me fiz infeliz:
Suspiros amortalhados...
Os silêncios me disseram
Tanta coisa estranha e
rara.
Os silêncios reverberam
O que a alma silenciara.
Um dia que esfria, e
chove,
A sombra que não se
move...
(E então choro... Não
repara!)
Os silêncios falam tanto!
A escuridão mostra a
trilha!
Surdo e cego, por enquanto,
E mudo como uma ilha.
Cego, surdo e mudo vou
No caminho que trilhou
Quem co’ sacro Verbo
brilha.
Campinas, 13 de outubro de
2017
Dizes
bem mais do que dizes
Dizes bem mais do que dizes
E Teus silêncios proclamam
A grã dor dos infelizes,
A ventura dos que amam.
Ao não dizeres, foi dito,
O blasfemo e o bendito
Que por serem ditos clamam.
Teu silêncio fala tanto!
Enche o universo de sons!
Fala ao riso, fala ao pranto,
Fala aos maus e fala aos bons...
Teu silêncio não existe!
No universo que esculpiste,
Teus sons são sempre ultrassons.
Mas falaste aqui na Terra,
Pela voz dos Teus Eleitos.
E, na verdade, não erra
Quem celebra Seus grãos feitos.
A Eles deste Tua voz
E, então, sofrimento atroz,
Vário nas dores e jeitos.
E sempre que Te calavas
Os céus falavam por Ti.
Se silentes são as lavas,
O vulcão já berra ali...
O que calaste, disseste;
O que disseste, calaste;
Nem faltou pingo num i...
Campinas, 03 de julho de 2016
Fiquei diante do espelho
Fiquei diante do espelho,
Tirei pelo das orelhas
(Tenho artrite num
joelho...),
Se não podo as
sobrancelhas
Ficam duas taturanas
Como as das bruxas insanas
Que fritam gente nas
grelhas.
O ouvido está entupido;
Tenho sebinhos nas costas;
Meu joelho é dolorido:
Mil dores me são impostas.
O distúrbio bipolar
Erigiu em mim seu lar,
Partiu-me em partes
opostas.
Faço aquilo que não quero[1]
E me entrego a devaneios.
Ai! e não faço o que eu
quero,
E me encolho nos receios.
Se eu não pensasse, seria
Ou um verme, ou pedra
fria,
Ou seres outros, bem
feios.
Cada vez que me contemplo
Suspiro imensa tristeza...
Quem seguisse o meu
exemplo
Mal findaria... é certeza!
Mas nos meus suspiros mil
Foi que a redenção se
abriu:
Pude amar Tua Beleza...
Barueri, HP, 26 de outubro
de 2016
[1] Cf. Romanos 7:19 — “Porque não faço
o bem que quero, mas o mal que não quero, esse faço.”
Não preciso olhar de novo
Não preciso olhar de novo
P’ra saber que vi o Sol.
Como pode tanto povo
Ser tão cego ao arrebol?
O Sol mesmo é sua prova;
Cada dia se renova,
Mas é sempre o mesmo Sol.
Quem amou o Sol de ontem
Que o de hoje também ame.
Nem precisa que lhe contem
Nem que o Sol mesmo lhe
clame.
Só de ver o seu fulgor
Já nasce espontâneo amor:
Que importa como se chame?
Sim! Há que se amar a Luz,
Não a lâmpada onde brilhe.[1]
É um só Sol quem nos
conduz,
Qualquer senda que se
trilhe.
Ama-se o Sol! Sua Face!
O ponto vário onde nasce
Não tem Luz que lá
rebrilhe.
Barueri, HP, 18 de maio de
2017
[1] ‘Abdu’l-Bahá,
Paris, 10 de novembro de 1911: — “A luz é
boa, seja qual for a lâmpada em que brilhe”.
Temei a noite, vós todos!
Sim! Temei-a, multidões!
A noite dos vis engodos;
A noite das decepções.
Não a do dia que acaba,
Mas a noite vera, diaba:
A noite dos corações.
Nas trevas d’alma, o amor
Sucumbe num grande abismo;
Fosso infinito de dor
Onde não chega o batismo.
Lá Deus é morto, bem
morto...
Não há paz, não há
conforto,
Só o caldeirão do egoísmo.
Temei as trevas da alma!
As há crentes ou ateias:
Nenhuma conhece a calma;
São violentas, são
plebeias.
As trevas do desamor
Matam qualquer um que for
Incauto em suas aleias.
A noite devora gente...
Carnificina geral!
A noite do ego insistente:
Não sabe o que é bem ou
mal.
É um monstro oco a rugir,
Só sabe, enfim,
destruir...
Temei a noite ancestral!
Campinas, 07 de janeiro de
2017
Chove forte (chove belo!),
Como não fora parar.
Enfurno-me no castelo
Que flutua em pleno ar.
O Dilúvio cobre a terra,
A fúria de Deus não erra,
A terra é toda só mar.
Ai de quem aceita vero
O relato deste feito.
Um sentido mais sincero
Deve ser visto com jeito:
Como colocar na Arca
A Natureza, que abarca
Mil milhões... num barco
estreito?
Há sentidos bem mais
plenos
Do que a matéria vigente.
Há simbolismos amenos,
Sem afogar tanta gente:
As águas do sofrimento
Afogaram os mil centos
Sem a arca da fé na mente.
Barueri, HP, 09 de março
de 2016
O que dirá o futuro
Dos nossos dias confusos?
Cada dia nasce duro,
Com mal-estares difusos.
Como seria diverso,
Se o povo segue perverso
Os mesmos costumes e usos?
Seguir sempre os mesmos
jeitos
E desejar melhoria
É um dos muitos defeitos
Deste mundo de hoje em
dia.
A mudança necessária
Tem-lhe a preguiça
contrária,
Ou então a rebeldia.
O que dirá o futuro
De nossos dias tristonhos?
Sendo o mundo belo e puro
Quem lembrará nossos
sonhos?
Quem colhe a colheita
esquece:
Toda faina que fizesse
Esvai-se em cenhos
risonhos.
Quando se ergue a catedral
Olvidam-se as fundações.
Nada é mais natural:
Não caberia objeções.
Mas p’ra serem esquecidas
São firmes quando
oprimidas,
Dispensam ostentações...
Barueri, HP, 20 de julho
de 2016
Fui ao tênis descuidado
E o Cupido me flechou!
Do paredão, no outro lado,
Achei quem a bola achou.
Ma devolveu gentilmente
E a vida, dali em frente,
Em encantos me levou.
Ah! Que Cupido que nada!
O próprio Senhor do Amor
Me venceu na raquetada!
(E eu mal podia supor!)
Como superar no jogo
Quem é Luz e Vida e Fogo,
Senhor de todo esplendor?
Tua candura me fez ver
Um mundo que eu não sabia.
Sempre vou agradecer
À bola que lá se ia...
Se não fosse o teu
sorriso,
Qual meu destino?... Impreciso...
(No tênis o céu havia...)[1]
Campinas, 02 de julho de
2016
Para Henri Vahdat, no dia
de seu aniversário.
[1] Meu
primeiro contato com a Fé de Bahá’u’lláh foi em um jogo de tênis, quando
conheci Henri Vahdat, que me apresentou a Fé em um dia lindo de inverno, em
julho de 1977.
Se eu fosse um bom jogador,
Não te havia conhecido!
Isso me deu o pendor
De ser muito agradecido
Não à perfeição, tão ela,
Mas à imperfeição, tão bela:
Veste tudo o que é nascido.
Se tênis eu bem jogasse,
Eu não perdia as bolinhas.
E ninguém que as encontrasse
Com o sorriso em que vinhas.
Ah! Por perder eu me achei!
E, na derrota, encontrei
As bênçãos que só são minhas!
Ah! Não é a perfeição
Que ampara, abençoa e salva!
Não é ela a intenção
Do Senhor da Estrela d’Alva.
Sim! Ele ama o imperfeito,
Encobre todo defeito,
Mesmo que a alma seja calva...
Campinas, 02 de julho de 2016
Para Henri Vahdat, no dia do seu aniversário.
Para Henri Vahdat, no dia do seu aniversário.
Quem em Ti acreditou
Passou da morte para a vida.[1]
Porém, quem ressuscitou
Não enfrentara a partida.
Deve ser, pois, outra “morte”,
E outra “vida”, de outro porte:
Metáfora garantida.
Da morte p’ra vida vamos
Se vivemos com amor.[2]
Não é o lugar onde estamos
Que determina o que for:
Há os que aqui estão e são mortos,
Pois vivem seus dias tortos;
Mortos sem tirar nem pôr.
Os que vivem, por amar,
Vivem mesmo quando morrem.
E é fácil adivinhar
Os sentidos que decorrem:
Ressurreição é da alma,
Não do corpo (calma! calma!),
As Palavras nos socorrem:
“Deixa que os mortos enterrem
“Seus mortos”,[3]
disse o Senhor.
Reclamem, gritem e berrem,
Argumentem o que for!
Não se tem escapatória:
A ressurreição em glória
Não é a de se supor.
Passamos da morte à vida
Quando amamos nosso irmão.
Sim, a morte a ser temida
Não é a do corpo são.
É a alma só que importa:
De nada vale ele não.[4]
A Ressurreição já veio,
E os mortos já levantaram.
Perambulam bem em meio
Desses que não despertaram.
Sair da morte do erro,
E do pecado o desterro,
Disso os Profetas falaram.
Para Pedro Ivo Generoso e Brenda Artuzi, no dia de seu casamento
Campinas-Brasília, 03 de novembro de 2017
Campinas-Brasília, 03 de novembro de 2017
[1] João 5:24 — “Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida.”
[2] 1 João 3:14 — “Nós sabemos que passamos
da morte para a vida, porque amamos
os irmãos; quem não ama a seu irmão permanece na morte.”
[3] Lucas 9:59-60 —
“E disse [Jesus] a outro [discípulo]: Segue-me.
Mas ele respondeu: Senhor, deixa que primeiro eu vá enterrar meu pai. Mas Jesus
lhe observou: Deixa aos mortos o enterrar os seus mortos; porém tu, vai e
anuncia o Reino de Deus.”
[4] João 6:63 — “O espírito é o que vivifica, a carne para nada aproveita”.
Que imenso és Tu, meu Deus,
Que não cabes no universo;
Mas dentro dos servos Teus
Cabes qual pequeno verso.
Ah! quanto eu disser de Ti
Tanto, por certo, menti:
Não és igual nem diverso.
Como és manifesto, Deus,
Que em tudo que há Te vejo!
Mas, Oculto dos ocultos,
Sinal Teu em vão almejo.
És Mistério de mistério,
És concreto e és etéreo:
O Bem pelo Qual arquejo.
Que enigma és, meu Deus,
Mistério envolto em segredo.
Mas Teus sacros versos vêm
Nesta terra de degredo.
Teus Santos sofrem por nós,
Por usarem Tua voz:
Os Senhores do vinhedo.
Que imenso és Tu, meu Deus!
Meu louvor tão fraco vai...
Acolhe-nos como Teus,
Que nossa alma se esvai.
Mistério, Enigma e Segredo,
Oh! quita de nós o medo:
Sê somente nosso Pai.
Campinas, 10 de setembro de 2019
Tanta tristeza, Senhor!
Teus olhos, imperturbáveis.
Dentro e fora, pranto e dor,
E inda mais dores prováveis.
Por que não Te mexes, Deus,
A salvar os filhos Teus?
Onde Tuas mãos amáveis?
Quão impassível és, Deus!
Vê como nos lamentamos!
Somos mesmo filhos Teus?
Não Te aflige que soframos?
Só silêncio... Nada dizes...
Enquanto nós, infelizes,
Para a morte caminhamos.
Mas... no silêncio, um trovão!
E um corisco em minha alma!
Tudo faz sentido, então;
Minha mão, no ar, se espalma;
E cubro a luz que me cega,
E o som que desassossega
Dá-me o sentido que acalma.
“Por te amar e proteger”,
Diz uma voz no trovão,
“Imolei Meu santo Ser
“Quando andei por esse chão
“Que chamas de casa e lar
“Sem saber que esse lugar
“É morada da ilusão.”
Quando foi que nos vieste?
Onde encontrar os Teus passos?
Foi do Norte, Sul ou Leste?
Quem recebeu Teus abraços?
“Vim tão claro quanto a noite,
“Mas por tua incúria foi-te
“Impossível ver Meus traços.”
“Vim de onde não sabias,
“Em hora boa e incerta.
“Me acolheram almas frias,
“Co’a vista d’alma coberta.”
Mas, Senhor, não Te mostraste?
Certo, invisível, negaste
Aos homens a descoberta.
“Não! Bem visível Eu vim,
“Mas também bem disfarçado.
“Quem tivesse amor a Mim
“Ver-me-ia revelado.
“Mas aos olhos impostores
“Pareci cheio de dores,
“Não o grande Deus amado.”
Senhor, e quando foi isso,
Que Te deixamos passar?
É vero Teu compromisso
De sempre nos amparar?
“Por suposto, é verdadeiro,
“Tanto que sou o Ceifeiro
“E o que a vida pode dar.”
“Vim disfarçado de homem:
“O Verbo que pus no mundo.
“As Lâmpadas vêm e somem,
“Eis o mistério profundo.
“Todas Elas são Eu mesmo;
“E não vêm ao mundo a esmo:
“São a guia que difundo.”
“Sou um só, como o é o Sol,
“Mas Meus Raios não se contam.
“Cada um, como um farol,
“Os bons caminhos apontam.
“Sou todos Eles e não;
“A Eles dou a missão
“Que os bem cegos de alma afrontam.”
Se tão assíduo vieste,
Por que não curaste tudo?
Por que os ais da dor e a peste,
E todo homem cego e mudo?
Acaso faltou-Te tempo,
Ou tiveste um contratempo?
Mas já me calo, miúdo.
“Tanto dei, e do Meu Ser!
“A terra se iluminava!
“Mas não quis Eu resolver
“O que só a ti bastava
“Para arrumar esta vida,
“Esta estrada só de ida
“Que só guia precisava.”
“E por te guiar morri
“Mil mortes em mil sendeiros,
“Pois sempre que Eu vim a ti,
“Me imolavas, qual carneiro.
“Pensando que Me agradavas
“Tu somente te privavas
“De Me acolher por inteiro.”
Mas, Senhor, como vieste?
Sem glória, sem anjos, nada!?
E os sinais que Tu nos deste
De uma comoção alada?
Todos miramos o céu,
Ninguém querendo ser réu
Nem ter a alma julgada.
“Do céu Eu disse que vinha,[1]
“Dali disse que viria.[2]
“Acaso não se adivinha
“O bom sentido que guia?
“Se Eu antes não vim do céu,[3]
“Como quer o povo incréu
“Que agora eu use esta via?”
“Se do céu Eu não desci
“Na primeira vez que vim,
(“Mas disse que vim dali
(“E foi registrado assim),
“É de outro céu que falei,
“Um céu no qual Eu sou rei,
“Um céu sem tempo e sem fim.”
“Se fora do céu visível
“Que Eu tivesse descido,
“Como seria possível
“Ter de Minha Mãe nascido?[4]
“E entretanto Eu desci
“Não deste céu dali,
“Mas de um céu mais escondido.”
“Um céu que somente é visto
“C’os olhos do coração.
“Um céu onde Eu próprio, Cristo,
“Aceno co’a salvação.
“Aquele que Me quer ver
“Antes precisa entender
“Que olhar para o céu é vão.”
Senhor! mas o Sol e a Lua
Que iam ficar escuros?
E até cada estrela nua
Cairia dos céus tão puros?
As bases do firmamento
Se abalariam no Advento,
No Teu Advento futuro.
“Se o céu
é só uma imagem,
“Tudo o mais nele, também.
“O céu concreto é bobagem:
“Deste céu Deus nunca vem.
“O que se vê é mortal,
“O que não, é imortal:[5]
“Não se vê o céu do Além.”
E as nuvens nas quais virias
Com todo olho a Te ver?
Tu acaso me dirias
Não mais que imagens só ser?
“Por certo, assim como o olho!
“Desta maneira é que escolho
“Quem tem olhos para crer.”[6]
“Eu disse, em igual teor:
“O Reino de Deus não vem
“Com aparência exterior.[7]
“É bem certo que se alguém
“Vir de forma material
“O que é só espiritual
“Jamais entrará no Além.”
“Falo por símbolos, sim,
“Para testar corações.
“Quem compreende vem a Mim;
“Venceu, do ego, as paixões.
“Mas quem com olhos mundanos
“Quer entender os Meus planos,
“Já se perde em confusões.”
“Não vem o Reino de Deus
“Com aparência exterior.[8]
“Que querem os filhos Meus
“Que mais claro Eu possa expor?
“Fechem a vista enganosa
“E abram a maravilhosa,
“Que contempla o seu Senhor.”
“A vista material vê
“Apenas o que perece;
“Só o que é mortal, porque
“Vê só o que desaparece.
“Os olhos do coração
“Veem outra dimensão:
“Enxergam co’a luz da prece.”
Entendo, Senhor, então,
Que quiseste prevenir
A dor e destruição
Como nos trouxe o porvir:
Vieste nos ensinar
Os caminhos a trilhar
Para a dança, o canto e o rir.
Por símbolos sei que falas,
Pois é linguagem eterna;
Desta forma é que assinalas
Tua intenção, que governa.
A metáfora transcende,
A letra cerceia e prende,
Perde o senso e desgoverna.
Se nos é um dissabor
A metáfora, que acalma,
É por nossa grande dor:
Somos mais corpo que alma.
E assim corpóreos, tão brutos,
Não temos, da fé, os frutos,
Nem do entendimento, a palma.
Campinas, 21 de setembro de 2018
[1] João
6:38 — “Porque eu desci do céu não para
fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou.”
[2] Mateus 24:30 — “Então,
aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem; e todas as tribos da terra se lamentarão e verão o Filho do Homem vindo sobre as
nuvens do céu, com poder e grande glória.”
[3] João
6:41–42 — “Murmuravam, pois, dele os judeus, porque dissera:
Eu sou o pão que desceu do céu. E diziam: Não é este Jesus, o filho de
José, cujo pai e mãe nós conhecemos? Como, pois, diz ele: Desci do céu?”
[4] João 6:42 — “Não
é este Jesus, o filho de José, cujo pai e mãe nós conhecemos?”
[5] II
Coríntios 4:18 — “não atentando nós nas coisas que
se veem, mas nas que se não veem; porque as que se veem são temporais, e as que
se não veem são eternas.”
[6] Mateus 13:15 — “Pois o coração deste povo se tornou insensível; de
má vontade ouviram com os seus ouvidos, e fecharam os seus olhos. Se assim não
fosse, poderiam ver com os olhos, ouvir com os ouvidos, entender com o coração
e converter-se, e eu os curaria’.”
[7] Lucas 17:20 — “O
Reino de Deus não vem com aparência exterior.”
[8] Id. Ibid.
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